Entre o Sentir e o Ser

A educação para a sexualidade em Portugal

Foto retirada do site da revista GQ

Foto retirada do site da revista GQ

Sexualidade da Geração Z

Nascer, ser e (trans)formar-se

As pessoas passam pela Avenida Central de Braga. Passeiam os cães. Os avós caminham de mochila às costas com os netos pendurados na mão. De fundo, ouvem-se as vozes e cantorias. É fim de tarde. Reina a calma.

Na relva verde clara, destaca-se um cabelo vermelho escuro e forte. É o Gui, tem 15 anos e anda no 10.º ano. Sentado, ajeita a camisola e ri envergonhado. “Sou um homem trans”, admite. Assumiu-se há um ano e meio. No entanto, foi no 5.º ano que começou a perceber que o “termo `rapariga´ não se encaixava”. Ignorou. “Não sabia que [a mudança de género] podia ser uma possibilidade”.

Essa ideia mudou quando começou a conhecer pessoas da comunidade LGBTQIA+. “Entendi o que sentia e que era algo que mais pessoas também sentiam e coisas que eram uma realidade comum”. A partir daí, começou a relacionar-se com os termos masculinos. As reações foram variadas. “Os meus amigos disseram-me que já sabiam”. Por outro lado, “a minha mãe acredita que daqui a uns anos passa”. O pai, apesar de trabalhar fora, diz que “é uma panca”.

Os comentários são uma constante. Gui diz ser capaz de os ignorar. Os colegas nem tanto. “Tenho amigos meus que ficam muito afetados. Já os chamaram de primatas e até ameaçaram de morte”. O seu tom de voz aumenta. Nota-se irritação.

“A culpa não é minha de ser assim. É do ambiente à nossa volta que não nos deixa crescer psicologicamente para aceitar que existem pessoas iguais”

Na escola, não se "fala sobre estas coisas”. Gui conta que o máximo que já teve foi a visita de um enfermeiro. Soube também que foi feita uma palestra sobre a orientação sexual e pessoas trans aos professores. “Tive uma professora que a primeira coisa que perguntou quando entrou na nossa sala foi os nomes e pronomes que queríamos que usasse”. O sorriso do rapaz vai de orelha a orelha. “Passava os intervalos a falar com ela sobre as questões LGBT”.

Apesar disso, “ainda há resistência pela maior parte dos professores. Existe uma visão muito fechada do que é um homem e uma mulher”.

Os alunos não se mostram diferentes. Conta que, para um trabalho, fez um questionário que circulou pela escola. Uma das perguntas era “Como te identificas?” com várias opções como: feminino, masculino, não-binário e, ainda, a opção outro. “A quantidade de respostas horríveis na última opção foi impressionante. Desde escreverem ´torradeira da primark´, ´cavalo´, ´transformer´. É ridículo. Os professores escolhem ignorar”. Suspira.

Em 2018, foi aprovada uma lei que salvaguarda a autodeterminação da identidade e expressão de género e a proteção das características sexuais de cada pessoa. No sistema educativo, esta lei prevê o desenvolvimento de medidas de prevenção e combate à discriminação e a formação dos professores e restantes profissionais neste tipo de questões.

“A escola podia, de certeza, fazer bastante mais”, acredita Gui. “Podia ter facilitado muito se toda a gente fosse ensinada sobre a diversidade de identidades de género, que existe e que não há problema. Se calhar a maioria das complicações que tive com os meus colegas não teria acontecido”.

Íntimos e (des)protegidos

Inês (nome fictício), 20 anos, abre a persiana do quarto e deixa que os primeiros raios de sol matinais adentrem o espaço. Entre sorrisos nervosos e mãos inquietas, conta-nos que terminou recentemente uma relação de quatro anos, três dos quais passados no ensino secundário.

É este período que a jovem relembra, quer pelos primeiros passos nas relações de intimidade, quer pela falta de informação para dá-los com segurança. No começo, o “medo” impunha o uso de proteção, mas o “passar do tempo” e a “confiança” no parceiro amoroso fizeram com que Inês deixasse de ter preocupações. “Criou-se uma rotina” e os contracetivos foram postos de lado. 

Tudo mudou na transição para a universidade. O relacionamento de Inês terminou, mas os hábitos de (não) contraceção permaneceram. A exclusividade sexual deu lugar a relações ocasionais, muitas vezes de apenas uma noite, mas o que surpreendeu a jovem foi continuar a não usar proteção.

O peso da gravidade das suas escolhas surge sempre no dia a seguir, exclusivamente direcionado para o risco de gravidez. “Nunca ninguém falou comigo sobre as infeções sexualmente transmissíveis (IST)”. A exceção foi uma amiga que alertou para a possibilidade de testagem gratuita no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Inês não fazia ideia: “O meu medo era só ficar grávida. Acho assustador. Foi me dito na escola que as IST existem, mas de uma forma muito leve.” 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estudou o comportamento de adolescentes europeus na saúde e no bem-estar entre o intervalo de 2017 e 2018. As pesquisas publicadas comprovaram que um em cada quatro jovens de 15 anos não utilizou nem preservativos nem pílulas anticoncepcionais na última relação sexual.

Inês é um nome e um rosto que personifica estes dados. Aos 15 anos, deixou de receber formação, na escola, sobre educação para a sexualidade. “No secundário, devem pensar que os alunos já estão informados, mas nem sempre é assim, nós não perdemos tempo a pesquisar sobre isso em casa”, adianta. Segundo a jovem, a temática é completamente esquecida mal se finaliza o terceiro ciclo. Para as instituições de ensino, abordar estes assuntos uma vez já “serve para a vida toda”.

A agora universitária conta que a sexualidade era limitada a um “quadro interativo ou PowerPoint”, mencionada por uma “professora de História que também lecionava Cidadania” ou pelo próprio diretor de turma. O único tema enfatizado era a gravidez na adolescência, no meio dos risos de troça dos alunos e dos constrangimentos dos docentes. 

Inês sentada na varanda

Inês sentada na varanda

"Não temos confiança para dizer a uma mãe que iniciamos a nossa vida sexual. Eu não contei, porque estava com medo. E o primeiro medo dos pais é sempre a gravidez na adolescência."

Um beijo colorido

Joana (esquerda) e Tatiana (direita) são colegas de turma na Universidade do Minho

Joana (esquerda) e Tatiana (direita) são colegas de turma na Universidade do Minho

“No Brasil, tive relações sexuais desprotegidas com um desconhecido. Fiquei com medo e fui a um médico, mais pelas doenças do que pela gravidez. Fiz exames e estava tudo bem” - Tatiana

Tatiana e Joana conversam no Campus de Gualtar

Tatiana e Joana conversam no Campus de Gualtar

"É preciso perceber que uma mulher, tal como um homem, pode ter vários parceiros sexuais sem ser julgada" - Joana

Tatiana, 20 anos, e Joana, 18 anos, não temem as câmaras. Sentam-se confortavelmente e encaram-nas, prontas para falar. Ao contrário de Inês, as duas amigas são bastante cuidadosas nas relações casuais que vão mantendo com diversos parceiros e parceiras. O uso de contracetivo é indispensável e foi, segundo as jovens, o único alerta da escola. 

Tatiana relembra o primeiro contacto que teve com sexualidade na escola. Foi no oitavo ano, com uma profissional de saúde na aula de Ciências Naturais. "A enfermeira trouxe preservativos, ensinou a colocá-los e foi-se embora." A experiência de Joana, num estabelecimento de ensino diferente, foi parecida.

As amigas conheceram-se na universidade. Apesar das respostas semelhantes e das experiências análogas, cresceram em regiões e contextos distintos. Tatiana, de origem luso brasileira, passou a adolescência entre continentes. Do Brasil trouxe a crua lucidez de uma realidade de gravidezes indesejadas e de infeções sexualmente transmissíveis.

Já Joana, nascida e criada em solo português, nunca tinha contactado diretamente com estes casos. Até há pouco tempo. “Usava preservativo para me proteger de uma gravidez. Entretanto, uma pessoa perto de mim apanhou uma IST e desde aí que a utilização tem também isso em mente."

O dia é de calor. O sol refulgente queima-lhes os rostos rosados. Joana e Tatiana fazem uma pausa para beber água. Retomam a conversa com a naturalidade de arranque. Perguntamos se podem falar sobre a sua orientação sexual. Com a mesma rapidez que engolem o líquido, respondem que sim. São ambas bissexuais. Ambas tiveram abertura para se assumirem e serem aceites pela família mais próxima. Contudo, o ambiente escolar não foi um local de segurança, compreensão e confiança para nenhuma.

Inclusão? "Só até certo ponto". Segundo Joana, "não há inclusão na informação que é passada" nas escolas. A "heteronormatividade" foi uma mancha vermelha que ocupou a educação das jovens. Tatiana sentia que a sua voz era "abafada", tanto por colegas como por docentes. “A Tatiana, bissexual, era olhada de lado. Não queriam que falasse porque este não era o caminho que queriam que seguisse".

Quando começou a explorar a sua identidade, apenas conseguiu receber os conselhos da mãe. “Quem tem abertura para falar sobre isso acaba por não querer, porque o assunto vira palhaçada na turma e os professores têm vergonha de responder".

Joana, que costuma "andar sempre com uma caixa de preservativos", não se protege com mulheres. Apesar de ter noção dos riscos, diz que "ninguém se deu ao trabalho" de explicar como ter relações seguras com o mesmo sexo. Na escola, os alertas eram meramente sobre "homens com mulheres".

"Dei por mim a fazer tudo o que ele queria só para evitar discussões"

Sentada na relva do Campus de Gualtar da Universidade do Minho, Maria (nome fictício) suspira. Ainda lhe custa falar sobre o antigo namorado. A história já passou, mas há marcas. A sua expressão endureceu quando lhe colocamos a primeira pergunta. A leveza no olhar e no sorriso escondeu-se com a memória. “Namoramos durante quatro anos”. Eram colegas de turma no secundário e o namorico começou na passagem do 11.º para o 12.º ano. “O início foi muito bonito, era um amor tão intenso e que eu achava que ia ser para a vida. Acreditava que tinha muita sorte por ter alguém que me amava tanto”.

No entanto, já existiam sinais. O primeiro aconteceu numa aula de Educação Física. “O professor comentou, em tom de brincadeira, que eu estava bonita e ele ficou louco com isso. Queria andar à porrada e foi preciso o professor falar com ele para acalmar a situação. Estava mesmo violento”.

Maria desvalorizou completamente aquelas atitudes. Para ela, era amor. As rosas começaram a murchar no segundo ano de relacionamento. “Entrei na universidade e comecei a sair à noite. Ele perseguia-me e dizia que não suportava a ideia de que outros olhassem para mim”. Mesmo quando estavam juntos em festas, a situação não se tornava mais fácil. “Eu estava a dançar e ele chegava a dizer que eu era uma puta, porque os gajos estavam a olhar para mim. Quando chegávamos a casa, ficava muito agressivo”. Maria deixou de sair com medo do que pudesse acontecer. “Cheguei a chorar, porque só queria ter uma noite divertida sem tê-lo a restringir-me”.

No decorrer desse ano, a pandemia da Covid-19 instalou-se e as portas fecharam-se. As aulas passaram para a tela do computador no aconchego de casa e as saídas à noite tornaram-se uma recordação de tempos passados. Pararam as perseguições, os insultos e o controlo. “Houve uma altura em que pensei acabar [a relação], mas como apareceu o vírus ele deu a desculpa de que tinha mudado. Estávamos bem, porque não havia outras pessoas a intrometerem-se”.

Foi no terceiro ano que as primeiras pétalas das rosas apodrecidas começaram a cair. “Ele ganhou novas amizades e meteu-se na droga. Deixou de se importar comigo, já não me via como um ser humano. Eu era só um objeto, vivia para ele".

O desespero agravou-se no quarto ano de namoro. As rosas morreram. “Dei por mim a fazer tudo o que ele queria só para evitar discussões, se não puxava-me as orelhas, empurrava-me. Às vezes, começava aos gritos na rua e eu ficava constrangida. Tinha vergonha que as pessoas pensassem que estava numa relação abusiva. Não queria que tivessem essa ideia, porque eu não sentia isso”.

De acordo com o Estudo Nacional sobre Violência no Namoro de 2023, realizado pela UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta) 53,1% dos participantes não considera o controlo como uma forma de violência e 25,5% não encara a perseguição como um comportamento violento. Entre os atos de violência mais legitimados, encontra-se o "insulto durante uma discussão" e o "procurar insistentemente". A amostra do estudo contou com 5916 jovens, com idades entre os 11 e os 25 anos.

Começando a perceber que a relação estava a piorar, Maria tentou várias vezes terminar. No entanto, “ele fazia sempre todo um choradinho, uma chantagem psicológica. Dizia que eu era o amor da vida dele, que queria ser o pai dos meus filhos e que tínhamos de estar juntos para sempre. Eu pensava que podia ser uma má fase. Acreditava que, no fundo, ele ainda me amava e que ia mudar”.

As esperanças acabavam sempre por não passar disso mesmo. “Houve uma vez em que me esbofeteou, o que fez com que batesse com a cabeça na parede. Fiquei um dia sem ouvir. Eu não me lembro o que provocou isso. Acho que foi uma coisa estúpida. Ele já me tinha dado chapadas, mas era sempre na brincadeira”. Há uma dor que se aviva a falar do passado. Nota-se no rosto, na expressão, no tom de voz.

Salva por um amor diferente

Foram as novas amizades que criou na universidade que a ajudaram a sair do desespero. Uma nova rosa foi plantada. “Comecei a contar estas coisas a algumas amigas, que me abriram imenso os olhos. Disseram-me que aquilo não estava certo. Sempre que contava algo, percebia que tinha mais coisas para contar. Eu só consegui terminar isto por causa delas”. Maria sorri. O medo de ficar sozinha tornou-se um pensamento infundado.

A jovem confessa que gostava de ter abordado melhor estas questões ao longo da adolescência. Só teve consciência de que existem relacionamentos abusivos quando chegou ao ensino superior. “Os professores falaram de violência no namoro em termos físicos. Aquilo que eu tinha visto eram fotos de pessoas completamente espancadas. Um relacionamento não precisa de chegar ao ponto de espancar a outra pessoa para ser abusivo”. Ainda hoje tem dificuldade em admitir que houve violência e abuso por nunca ter atingido um limite extremo.

Sexo e sexualidade. O que nos leva a pensar que são a mesma coisa?

A sexualidade é, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), "uma energia que motiva a procurar amor, contacto e intimidade, que se integra no modo como se sente, move e toca. É ser-se sensual e ao mesmo tempo sexual. Influencia pensamentos, sentimentos, ações e interações e, por isso, influencia também a saúde física e mental". É através da sexualidade que a pessoa se define e se relaciona com o outro.

É vivida e expressada de diversas formas (através de desejos, fantasias, comportamentos, relacionamentos) e pode ser também influenciada por vários fatores (políticos, económicos, biológicos, culturais).

A partir de uma "educação sexual positiva e eficaz" é que se pode entender a natureza da sexualidade. Esta que, segundo a Associação para o Planeamento da Família (APF), "ajuda a crescer e a ter uma vivência sexual responsável e saudável".

Estão as escolas a educar para a sexualidade?

Os carros passam freneticamente na estrada, as ruas estão agitadas e ouvem-se buzinadelas de quem está com pressa para começar o dia. Os jovens, de mochila às costas e ainda com ar ensonado, entram num edifício grande e moderno. O vermelho ardente da parede da entrada contrasta com o céu carregado de nuvens escuras. Por cima lê-se: Escola Secundária Alberto Sampaio. Estamos em São Lázaro, Braga.

Por dentro, a grandiosidade é a mesma. Os três lanços de escadas fazem-nos curvar a cabeça para olhar o teto. As cores das paredes variam entre os cinzas monocromáticos. Os trabalhos dos alunos alegram o espaço. Estes, por sua vez, sentados à frente das salas. Uns conversam, outros estão no telemóvel. Mas todos à espera do mesmo: que a aula comece.  

Ainda no primeiro piso, ao fundo do corredor, destaca-se uma porta. Tem mais cor. É o gabinete de Informação e Apoio ao Aluno na área de Educação para a Saúde/Sexualidade (GIAA). Aqui, encontramo-nos com Tânia Santana, coordenadora na área de educação para a saúde.

Tânia Santana

Tânia Santana

Está há dois anos na ESAS, dá formações a professores desde o primeiro ciclo até ao secundário e é a responsável do GIAA. “Aqui damos apoio aos alunos. É um espaço onde podem encontrar confidencialidade, informação científica clara e adaptada ao que precisam".

A escola trabalha em parceria com o Programa Regional de Educação Sexual em Saúde Escolar (PRESSE), promovido pela ARS Norte (Administração Regional de Saúde do Norte). Um programa que apoia a implementação sexual nas escolas através de um processo educativo ativo e interdisciplinar. “Promovemos ações em sala de aula e temos enfermeiros que estão disponíveis a vir cá”.

Programa implementado na escola. A Estela e o Sérgio acompanham o percurso curricular e o desenvolvimento dos alunos

Programa implementado na escola. A Estela e o Sérgio acompanham o percurso curricular e o desenvolvimento dos alunos

As formações aos professores também são orientadas pelos materiais que o programa dispõe. “Há um perfil de trabalho para se poder abordar estas questões. Não se pode passar opiniões próprias, nem fazer juízos de valor”. Os docentes que não “compreendem certas coisas, não falam do assunto”. Tânia Santana salienta que a educação para a sexualidade nas escolas “não é para doutrinar ninguém. É para dar informação correta para os estudantes protegerem a própria saúde”.

“Não se exclui nem orientações, nem diversidade, nem gravidez, nada. Não há tabus. Fala-se de tudo desde que seja adaptado à faixa etária”.

A legislação prevê um número de horas por ano que se deve trabalhar a sexualidade com os alunos. “E pode ser na História, sobre a evolução das sociedades e dos valores, ou nas Ciências, a parte mais física. Com historinhas no primeiro ciclo ou com a literatura em Português. Em todas as áreas, pode-se trabalhar. Pode e deve”, salienta a professora.

Para além do PRESSE, o trabalho é ainda articulado com outras entidades. “Temos estado a colaborar com a equipa da saúde escolar e a Escola Segura. Recorremos também à Liga Portuguesa Contra o Cancro e com o programa ´Liga-te´ abordamos várias áreas, desde o consumo de drogas às doenças sexualmente transmissíveis”.

A voz de Tânia Santana sobressai-se. Já não se ouvem os burburinhos no corredor. “Trabalhamos com o que temos e articulamos os nossos recursos de modo a criar algo que se torne eficiente”. A professora de Biologia e Geologia parece confiante. “Estamos a fazer um bom trabalho, depressa vamos conseguir chegar a todos os alunos e professores”.

No entanto, há aspetos que ainda podem ser melhorados e barreiras que dificultam a chegada até à meta. O número de horas disponibilizadas para abordar a sexualidade é uma delas. “Não temos horas específicas, temos de tirar a outras disciplinas”. Mas a carga horária e a quantidade de conteúdos programáticas pouco tempo deixam. “Assim, é obvio que quando são exigidos resultados no final do ano, estes sejam limitados”.

“A ignorância é a principal arma para o desrespeito pela diversidade”

Em abril deste ano, foi aprovado um projeto lei que estabelece as medidas administrativas a serem adotadas pelas escolas quanto à autodeterminação da identidade e expressão de género. Assim, todos os estabelecimentos de ensino devem identificar uma pessoa — ou mais — a quem possam ser comunicadas as situações de disforia de identidade e de expressão de género. Ou o desrespeito por elas.

Na ESAS, já havia esta preocupação. Para a professora, é preciso encarar estas questões com normalidade. “Não tem de haver uma coisa especial, porque assim deixa de ser algo natural”.

Contudo, “há pessoas que não compreendem, que desconhecem ou que não apoiam. Mas acima de tudo, tem de haver respeito”. Tânia Santana conta que as sessões realizadas com os alunos são um espaço aberto ao debate com “regras muito claras” quanto à consideração pelo outro.

“Não podemos fazer de conta que não existem estas questões. E não podemos dizer que são modernices ou que são causadas pelo efeito de estufa, que são doenças ou fantasias. É o que a natureza tem desde sempre e há que falar sobre elas”

Um manual sem instruções para a sexualidade

É preciso atravessar campos e ruas estreitas, uma ou outra curva mais apertada, para chegar a uma pequena vila no concelho de Guimarães, Ronfe. A tranquilidade contrasta com a azáfama do centro de Braga. O urbano dá lugar ao rural. À medida que chegamos, torna-se visível uma longa extensão de grades amarelas. É o nosso destino final: Escola Básica Abel Salazar.

Já no interior do edifício, subimos as escadas. Os nossos passos são abafados pelo barulho das crianças do 5.º ao 9.º ano que convivem no recreio. Na sala do aluno, encontramo-nos com Alexandre Trindade, professor e coordenador da Disciplina de Cidadania e Desenvolvimento.

Encostado numa cadeira branca, aproveita o tempo entre aulas para falar um pouco sobre como funciona a disciplina. Conta que a escola definiu a Cidadania como anual, com uma duração de 45 minutos por semana. Direitos Humanos, Igualdade de género, Interculturalidade, Literacia Financeira e Segurança Rodoviária são alguns dos temas abordados. A Sexualidade e os Afetos englobam esta longa lista.

Em 2018, a Cidadania passou a fazer parte dos currículos escolares, funcionando como uma disciplina autónoma no 2.º e 3.º Ciclo do ensino básico. No 1.º Ciclo, é uma área abordada no âmbito de outras disciplinas e no ensino secundário são as escolas que definem. O objetivo é contribuir para "uma plena formação humanística dos alunos".

As palavras do professor sobrepõem-se às brincadeiras dos alunos que se ouvem do corredor. Conta que também estes foram ouvidos no momento de planear a disciplina. “No início da Cidadania, fizemos um questionário aos alunos acerca dos domínios que queriam abordar e em que anos. Recebemos estas propostas e organizamos a distribuição dos temas”.

Alexandre Trindade confessa que não é uma disciplina como as outras. “Não são abordagens muito aprofundadas, é sempre muito prático. Não há testes, mas sim trabalhos, pesquisa, debate…”

Sendo uma disciplina que inclui tantos e tão variados temas, "nenhum professor tem toda a preparação para todas as áreas". Habitualmente são os docentes das ciências sociais e humanas, como Geografia e História, que costumam ficar com essa responsabilidade. No entanto, pode ser necessário chamar outros professores.

Esta realidade, um pouco diferente do que acontece com a generalidade das disciplinas, leva a que os professores se sintam mais à vontade para falar de certos tópicos e não tanto de outros. A sexualidade é um tema "delicado", como explica Alexandre Carvalho. "Há professores que estão mais à vontade e há outros que não. Nestes casos, têm de se refugiar noutras estratégias". Contudo, reconhece que a temática tem sido abordada de uma forma adequada, indo ao encontro dos interesses e necessidades dos alunos.

Esta articulação entre as duas disciplinas tem um único objetivo: não repetir informação. Enquanto as ciências se dedicam à parte "fisiológica e mecânica", a Cidadania foca-se na "parte emocional da sexualidade". Estas aulas são complementadas por sessões com a enfermeira. "Faz sempre uma exposição sobre várias doenças sexualmente transmissíveis e outros assuntos. Acontece pelo menos uma vez por ano".

A enfermeira Ângela Silva ainda está a conhecer os cantos da casa. Encontra-se há apenas um ano na Abel Salazar, mas os alunos já a param nos corredores e "colocam questões". Os profissionais de saúde, segundo diz, conseguem abordar o tema de "uma forma mais leve, com naturalidade" e, assim, captar a confiança dos jovens.

Parte do corpo docente trata a sexualidade na disciplina de Cidadania, no entanto, a maioria não é formada nesta área. Na visão da enfermeira, é normal que seja "constrangedor" para alguns professores "que não estão tanto à vontade". Por essa mesma razão, existe uma certa "resistência", por parte dos alunos, em "esclarecer dúvidas" abertamente com os professores. A convivência diária em contexto de sala de aula causa o receio de que os educadores encarem os estudantes de "forma diferente".

É no seu gabinete pessoal, na Escola de Educação da Universidade do Minho, que a investigadora Zélia Anastácio nos explica o "processo complexo" da formação de docentes em educação para a sexualidade. "Há muito pouco investimento na capacitação de professores", garante. Tal como o número de formações, o número de formandos também tem vindo a diminuir.

No entanto, segundo Zélia Anastácio, "não funciona" atribuir uma função aos docentes sem que eles tenham preparação para tal. "Temos de responsabilizar quem prepara estes currículos", já que "não há responsabilidade em formar". Insiste que "foi mais fácil implementar o Inglês no primeiro ciclo sem tanta legislação do que implementar a educação para a sexualidade", já discutida desde 1984. Contudo, apenas em 2009, é aprovada a sua obrigatoriedade em todos os estabelecimentos de ensino básico e secundário.

"De uma forma nada formal", é a enfermeira Ângela quem dá assistência às "dúvidas" e aos dilemas "privados dos alunos". Através do Gabinete de Informação e Apoio ao Aluno (GIAA), passou a existir um espaço seguro e acolhedor para a aquisição de "conhecimento fidedigno".

Neste momento, o Agrupamento de Escolas Professor Abel Salazar trabalha unicamente com o projeto PES (Promoção e Educação para a Saúde) em questões de sexualidade. Ângela desenvolve algumas sessões de educação para a saúde ao longo do ano letivo, tendo como guia orientador o Plano Nacional de Saúde Escolar (PNSE), que considera estar "muito bem organizado e definido".

"Perante as necessidades que vão surgindo", fazem-se "ajustes" e "modificações". A urgência de falar sobre a diversidade de género, por exemplo, trouxe propostas de novas atividades. A ideia seria elaborar "duas dinâmicas com os nonos anos", de preferência ainda neste "último período", ou então no próximo ano letivo. Ângela encara com otimismo o futuro de uma escola que diz ser "muito inclusiva". Sorri calorosamente.

 

Educar para o Sentir

Dos miúdos...

Na margem do Rio Lima, situa-se uma pequena vila do distrito de Viana do Castelo. O verde domina a paisagem e a brisa fresca embala os novos visitantes. O sossego banha as ruas, onde os residentes vivem sem pressas. É preciso subir uma estrada íngreme, afastada do centro, para ouvirmos os risos e a agitação dos mais novos. Chegamos à Escola Básica Diogo Bernardes, em Ponte da Barca. 

Os funcionários recebem-nos com um sorriso na cara. O tom familiar é uma constante nesta terra. Ao entrar no bloco B, somos surpreendidas por colagens, desenhos, pinturas, bonecos e bonequinhos. Na sala de aula do 3.º B, o ambiente não é diferente. Espreitamos pelo vidro da porta. Multiplicação, divisão e adição são a lição do dia. A aula de Matemática ainda não acabou. 

Acompanhadas pela psicóloga Marta Cunha, entramos na sala. Rapidamente um conjunto de pequenos olhos se arregalam, maravilhados pelos estranhos objetos - as câmaras e os tripés - que invadem o seu espaço. A professora de bata azul confia o lugar à psicóloga. “Abram na página do trabalho de casa que eu pedi”. A tarefa era pensar em três situações em que o “Sr. Raiva” esteve presente. Marta Cunha utiliza as personagens do filme Divertidamente para abordar o assunto das emoções.

Por entre “esqueci-me(s)” e dedos no ar,  João é o primeiro a intervir. “Fico chateado quando me irritam, zangado quando me dizem coisas más e furioso quando dizem mal do meu pai”. Francisco também quer falar. Conta que fica chateado quando as pessoas não o ouvem, zangado quando gozam com ele e furioso quando lhe dão pontapés. O objetivo da atividade é perceber como as crianças lidam com situações de frustração e irritação e como podem reagir perante elas. 

Alunos atentos à sessão da psicóloga

Alunos atentos à sessão da psicóloga

Aluno a ler a ficha dada pela psicóloga

Aluno a ler a ficha dada pela psicóloga

Aluno a pintar a ficha sobre as emoções

Aluno a pintar a ficha sobre as emoções

Alunos a assistirem à sessão da psicóloga

Alunos a assistirem à sessão da psicóloga

Psicóloga a explicar o exercício da sessão

Psicóloga a explicar o exercício da sessão

Psicóloga a tirar dúvidas a um aluno

Psicóloga a tirar dúvidas a um aluno

Aluna a preencher a ficha sobre as emoções

Aluna a preencher a ficha sobre as emoções

Item 1 of 7

Alunos atentos à sessão da psicóloga

Alunos atentos à sessão da psicóloga

Aluno a ler a ficha dada pela psicóloga

Aluno a ler a ficha dada pela psicóloga

Aluno a pintar a ficha sobre as emoções

Aluno a pintar a ficha sobre as emoções

Alunos a assistirem à sessão da psicóloga

Alunos a assistirem à sessão da psicóloga

Psicóloga a explicar o exercício da sessão

Psicóloga a explicar o exercício da sessão

Psicóloga a tirar dúvidas a um aluno

Psicóloga a tirar dúvidas a um aluno

Aluna a preencher a ficha sobre as emoções

Aluna a preencher a ficha sobre as emoções

A aula acabou. Agora é a vez do 4.º C. A sala é mais escura, mas a decoração infantil ilumina e torna o espaço mais acolhedor. As mesas formam um U, aproximando os alunos que brincam uns com os outros. O quadro já não tem contas, mas a lição de Português. Também esta foi pausada pela psicóloga Marta. “Quem está a faltar hoje? Só a Clarita?”. Ouvem-se cadeiras a arrastar e vozes irrequietas.

“Alguém se lembra da página em que ficamos?”. O exercício é o mesmo. Contudo, a abordagem é ligeiramente diferente - são crianças mais velhas e com personalidades distintas. À medida que os alunos vão dando respostas, os colegas intervêm. Diogo confessa que se sente chateado quando “está a dizer alguma coisa e os colegas interrompem por causa que…” A voz de Brian sobrepõe-se à de Diogo. “Não é assim que se diz, é `porque´". As tensões entre amigos de turma parecem ser um tópico frequente.

Além disso, são abordadas também as relações familiares. “Fico chateada quando a minha irmã não me liga quando está com as amigas”. É a “Martita” a falar. Conta ainda que fica “furiosa quando os pais não fazem o que prometem”. Finalmente, é a vez do Brian. Ajeita-se na cadeira e levanta a folha. “Fico chateado quando não como gelado”. Ecoam gargalhadas. Fica zangado quando o magoam e furioso quando gozam com ele. 

Para a psicóloga, “é crucial focar estes temas o mais cedo possível”. O foco é facilitar os “tipos de conexões que a criança vai ter na vida adulta”. “Elas [crianças] têm muita dificuldade em controlar a raiva. O discurso é pautado pelo ´se ele me dá um pontapé, eu dou dois ou três´ e temos de resolver isso”.

Foi por iniciativa do agrupamento que se concorreu a um Fundo Comunitário Europeu, de forma a conseguir ter verbas para “disponibilizar todos estas possibilidades aos alunos”.

Aos graúdos...

Continuamos a subir a rua até chegar à Escola Secundária de Ponte da Barca. Também aqui são realizadas sessões pela psicóloga. Estas fazem parte da oferta complementar. É constituída por 12 sessões onde cada uma tem um tema específico. Aqui está também em funcionamento o PRESSE, usado como guia quanto aos conteúdos programáticos.

A euforia típica das crianças é substituída pela apatia dos adolescentes. Já não se veem pinturas e desenhos, as paredes estão em branco. Não há correrias, apenas se ouve o burburinho das conversas. Na entrada, ressalta à vista uma exposição sobre o 25 de Abril. Contornamos o mar de cartolinas até encontrarmos a "Sala do Futuro". Tudo naquela sala foge ao que estamos habituadas a ver. Cadeiras com rodinhas e pinturas abstratas transportam quem entra no espaço para outra dimensão. 

Misturamo-nos com os estudantes do 8.º B. Vai começar a última sessão com a psicóloga Marta Cunha. Hoje sobre a autoestima corporal. Irrequietos e faladores, os alunos e alunas assistem a dois vídeos que se enquadram no projeto “Dove: Eu confiante!”. Abordando especificamente a complexidade do ser feminino, os rapazes sentem-se “excluídos”. “Isto não é para nós. Não compramos soutiens”. Riem-se.

Há tempo para um terceiro vídeo. Adolescentes e crianças são questionadas sobre o que mudariam no corpo. Os primeiros querem um "nariz mais pequeno", os segundos uma "cauda de tubarão". A diferença das respostas é algo que espanta os estudantes.

"Porque à medida que crescemos começamos a meter defeitos em tudo?", pergunta a psicóloga. Bullying é a primeira resposta. "Nós acreditamos no que as outras pessoas nos dizem". Também se fala no impacto das redes sociais. Marta Cunha alerta os jovens para não confiarem em todas as mensagens que recebem. Mas a conversa não fica por aí. Também as relações familiares são apontadas como uma possível causa. "A família da minha vizinha, que é um ano mais velha do que eu, dizia-lhe sempre que estava gorda. Ela começou a recusar comer e agora está sempre a desmaiar", conta uma das alunas.

O som da campainha ecoa pela sala. A aula acabou. As vozes misturadas pelas conversas paralelas são substituídas pelo arrastar das cadeiras. Os alunos despedem-se da psicóloga e, de mochila às costas, vão para o intervalo. Nós vamos em direção ao bloco B.

Numa sala “de volta ao presente”, os alunos do 8º D estão dispersos. São poucos, mas a algazarra faz com que pareçam muitos. “Virem-se para a frente e silêncio”. Vai começar a sexta sessão desta turma com Marta Cunha. O tema é: “Sê a mudança”.

As luzes apagam-se. Baixam-se as persianas. E entre risos e chamadas de atenção, a turma assiste a três vídeos relativos à temática. O primeiro sobre uma rapariga que criou uma banda desenhada com super heroínas, representando diferentes corpos femininos. Desde as mais “fortezinhas”, às mais magras, altas e baixas. Para o Tomás, a mensagem que se pretende transmitir é “sê quem tu és”. E “para não nos preocuparmos com a opinião dos outros”, completa o colega de mesa, Hugo.

“Meninos, não se riam”, diz a psicóloga antes de passar para o segundo vídeo. É sobre a compra de soutiens. “Vocês [rapazes] não compram, mas podem sempre acompanhar…” Marta Cunha é interrompida por um aluno. “E os gajos que são meios…gordos?”. As gargalhadas são interrompidas por uma voz feminina ao fundo da sala. “Não tens de dizer isso sobre uma pessoa. Foi uma piada sem graça”. A psicóloga intervém. “É para isso que cá estou. Para vos explicar que têm de ter muito cuidado com as mensagens que transmitem”.

O trabalho passa agora para as mãos dos estudantes. Divididos em grupos, são desafiados a criar uma atividade que sensibilize para a autoestima. Entre os dedicados e preguiçosos, estes “entretém-se” até o final da aula.

No que toca à educação para a sexualidade em Portugal, a psicóloga acredita que ainda há um longo caminho por percorrer. O problema é que “ainda não há uma abertura suficiente na sociedade para falar sobre determinadas questões. As pessoas parecem ter medo de dizer a palavra homossexual”.

"As escolas de Ponte da Barca estão a fazer um esforço”, confessa a psicóloga Marta.

Psicóloga a introduzir a sessão à turma

Psicóloga a introduzir a sessão à turma

Professor da turma a orientar os alunos na atividade

Professor da turma a orientar os alunos na atividade

A turma a visualizar um vídeo sobre autoestima e confiança

A turma a visualizar um vídeo sobre autoestima e confiança

Alunos a interagir durante a sessão

Alunos a interagir durante a sessão

Alunos atentos à sessão

Alunos atentos à sessão

Alunos a realizarem uma atividade de grupo

Alunos a realizarem uma atividade de grupo

Entre linhas e leis

Educar para a Cidadania

No ano letivo 2018/2019, o governo implementa em todas as escolas a disciplina "Cidadania e Desenvolvimento". Esta foi a forma encontrada para responder a uma necessidade de "competências para o exercício da cidadania democrática". Assim, as escolas têm de preparar os estudantes para as "exigências da sociedade contemporânea". Na sala de aula, agora também se aborda "a igualdade nas relações interpessoais, a integração da diferença, o respeito pelos Direitos Humanos”.

A Educação para a Cidadania integra os currículos de todos os anos de escolaridade, do ensino básico e do ensino secundário. No 1.º Ciclo do ensino básico, a CeD é uma área de trabalho transversal, incluída nas diferentes disciplinas. No 2.º e 3.º Ciclo do ensino básico, a CeD é autónoma e obrigatória e, enquanto disciplina, pode funcionar de forma trimestral, semestral ou outra. No ensino secundário, a própria escola deve decidir como implementa a Cidadania e Desenvolvimento.

Os temas a lecionar no âmbito da Cidadania e Desenvolvimento organizam-se em três grupos:

O Ministério da Educação, em colaboração com outras instituições públicas, dispõe também de documentos que auxiliam os docentes a preparar e a lecionar a cidadania.

"Não aprendemos apenas contas. Aprendemos o que mais conta!"

A educação para a sexualidade é uma importante dimensão da promoção e proteção da saúde. É neste seguimento, que o PRESSE, um Programa de Educação Integral da Sexualidade, assume um papel de “modelo para o desenvolvimento deste tipo de educação, envolvendo diversos conteúdos”. De acordo com a equipa regional do PRESSE, “o programa é uma resposta estruturada e sustentada. Começa no 1º ciclo e termina no secundário”.

“A educação para a sexualidade fala sobre os direitos da comunidade LGBT em Portugal. Fala que os rapazes podem brincar com bonecas e as raparigas podem jogar futebol. Fala como comunicar de forma eficaz e como nas tarefas domésticas todas as crianças e pais tem obrigação de participar”.

Com “conceitos-chave e objetivos claramente definidos”, trata-se de uma "equipa de saúde escolar", constituída por enfermeiros, psicólogos e médicos. Uma equipa de trabalho que “estrutura, produz, executa, monitoriza, avalia e apoia a implementação do PRESSE”. As suas medidas de intervenção passam por garantir “uma formação aos professores de forma gratuita" e assegurar "o acesso [à educação para a sexualidade] para miúdos”.

"Os professores são os atores principais na aplicação do programa pois são eles que tem contacto privilegiado com os alunos"

Segundo a UNESCO, “profissionais bem treinados, motivados e apoiados, desempenham um papel fundamental na prestação de uma educação integral da sexualidade de excelência”. O PRESSE segue a ideia como mote. Focados na formação dos profissionais, esta funciona em dois níveis.

“A formação de 1º nível é uma base da educação sexual. Ensina estratégias pedagógicas da sexualidade humana, o perfil de um educador e as dinâmicas de grupo para ensinar a educar”, explica a equipa. “A formação de 2º nível é para profissionais que já tenham, pelo menos, um ano de aplicação do programa. Consiste na abordagem de temas mais específicos”. A última formação aludiu à sexualidade na era digital. Também já foram expostos temas como a sexualidade e diversidade funcional e sexualidade e violência.

Professores a jogar "Capuchinho ao pé cochinho", que é implementado a alunos do 1º Ciclo, numa formação PRESSE (Imagem fornecida pela equipa regional do PRESSE)

Professores a jogar "Capuchinho ao pé cochinho", que é implementado a alunos do 1º Ciclo, numa formação PRESSE (Imagem fornecida pela equipa regional do PRESSE)

É através do “modelo de educação sexual democrática” que o programa promove um “desenvolvimento curricular na educação para a sexualidade”. As temáticas são ajustadas às orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), da UNESCO, da lei de 2009, e do GTES - Grupo de Trabalho sobre a Educação Sexual.

O programa possui, também, um conjunto de materiais pedagógicos que “são desenvolvidos com o propósito de facilitar a devida implementação da educação sexual”. Desde presse-books (manuais digitais), a jogos presse e presse-kits, são disponibilizados recursos para a equipa regional de docentes e os alunos aprenderem a sexualidade “de uma forma mais dinâmica”.

Manuais digitais de cada Ciclo de estudo

Manuais digitais de cada Ciclo de estudo

O PRESSE abrange toda a região Norte e está a ser aplicado em cerca de 80% dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas. Galardoado com o primeiro Prémio de Excelência e Inovação em Educação Sexual, pela Associação Mundial de Saúde Sexual (WAS), a equipa defende que a saúde pública deve assegurar “que todos os cidadãos têm igualdade de oportunidades". É promovido "o direito de acesso universal à educação sexual". Ninguém fica de fora.  

Aos olhos de Zélia Anastácio, o PRESSE é um "programa muito crítico". Acompanha-o desde o seu início e chama-lhe "educação sexual à pressa". A professora da Escola de Educação da Universidade do Minho ressalta vários pontos negativos que a fazem contestar este “modelo impositivo” de educação para a sexualidade.

Zélia Anastácio começa por afirmar que o Programa Regional não ouve os alunos nem sabe “quais são as suas necessidades de acordo com a faixa etária”. Para além disso, não existe qualquer tipo de relação de confiança entre as duas partes. “Quebrar os muros” e trabalhar um conceito abrangente desta temática é uma tarefa complicada, enquanto “tivermos enfermeiros a irem à escola abordar questões meramente biológicas e métodos contracetivos”.  

A investigadora salienta também que o modelo do PRESSE é “igual para todas os sítios”, sendo que as escolas e os alunos “não são todos iguais”. Não há, portanto, uma adaptação ao “contexto”, mas sim uma “imposição” do programa. O PRESSE estabeleceu-se como uma “autoridade na saúde”. Estando todas as atividades e formações “estipuladas”, torna-se difícil que alguém externo, mesmo tendo especialidade na área, entre nas instituições de ensino para complementar o trabalho que já é realizado. Apenas com “autorização do Ministério de Educação” existe essa possibilidade. 

Zélia Anastácio já ouviu vários testemunhos de alunas de mestrado que, em formação com o PRESSE, se sentiram “ofendidas” pela falta de reconhecimento aos profissionais de ensino. “Tratam os professores como sendo recetores vazios daquele conhecimento, chegam a ser ofensivos”.

Educar entre o lar e a sala de aula

Isabel Rodrigues é mãe de uma pessoa trans. A "escola tem um papel fundamental e primordial" na educação para a sexualidade. "Nem todas as famílias são funcionais" e, por isso, o ensino público deve salvaguardar a saúde e o bem-estar das crianças, "ensinando-as". E os pais? Como é que estão inseridos na sexualidade dos filhos? Muitos atravessam várias dúvidas e inquietações, necessitam de compartilhar vivências entre si. É o caso de Isabel, que encontrou compreensão e conhecimento na Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género (AMPLOS).

A associação surgiu em 2009, pela urgência de um grupo de progenitores e familiares que se ajudassem entre si, partilhando dúvidas, receios e conselhos sobre pessoas LGBTQI+. Com estatuto de Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) desde 2019, a AMPLOS é uma zona “segura” de “descriminação e estereótipos”. Afirma-o Manuela Ferreira, uma mãe AMPLOS capaz de “contar a história” da iniciativa, por ser “das mais velhas”. 

“Lutar por uma sociedade mais justa” é o que pretende a associação. Faz “ações de sensibilização, divulgação e apoio”, junto das famílias, mas também dos profissionais de educação. Um dos projetos mais completos chama-se “Ampliando famílias”, que consiste num conjunto de guias "validados cientificamente" para lares com pessoas LGBT. A psicóloga Ana Silva, uma das "mães" do projeto, destaca a importância do mesmo pela “falta de conhecimento” ainda existente, o que resulta em "ideias estereotipadas". "Não adianta ter direitos e garantias salvaguardados na lei, se as pessoas não souberem”.

É também pelo ZOOM que conhecemos o SALL - Associação de defesa da liberdade, uma associação com ideias muito distintas às da AMPLOS. Dedica-se "à defesa da liberdade de educação, de expressão e de religião por meios legais e recurso a vias judiciais". Nasceu no seio de um grupo de advogados, mas rapidamente se espalhou a vários ofícios interessados na "intervenção pública". Foi o caso de Teresa Fonseca, arquiteta, mas ligada à área da educação dentro da associação.

Entramos então pelo caminho da educação. O SALL acredita que "os primeiros educadores dos filhos são os pais", que devem "escolher o género de educação e de projetos educativos que considerem mais adequados". Teresa Fonseca considera que muitas vezes os conteúdos curriculares sobre a sexualidade "perturbam" este direito preservado às famílias. O motivo? "A ideologia no ensino".

Para a arquiteta, a "visão antropológica tradicional judaico-cristã" está a ser ameaçada por um "ensino da sexualidade" similar a um "programa matemático". "Nós não queremos acabar com a educação para a sexualidade", ressalta. No entanto, nomeia alguns critérios que deviam ser reestabelecidos. As faixas etárias, por exemplo, "deviam ser respeitadas". Conta, inclusive, que muitas crianças não se sentem "confortáveis" com a abordagem dos conteúdos educativos. Além disso, não concorda que os alunos sejam "confrontados" com estes temas, sem a aprovação dos pais ou a antecipação dos ensinamentos em casa. Enquanto não houver "transparência" com a família, o SALL vai continuar a "mover-se" por esta causa.

Além dos manuais

De regresso ao coração bracarense, numa rua pouco movimentada e até escondida, encontramos a sede do Núcleo de Braga da UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta). Fundada em 1976, na altura com o nome “União das Mulheres Antifascistas e Revolucionárias”, a associação feminista encontrou, em 2008, na Cidade dos Arcebispos um novo espaço para difundir as suas ideias.

O exterior do prédio em nada desvenda o ativismo cozinhado no interior. Alícia Wiedemann recebe-nos com amabilidade. É voluntária na UMAR desde 2018, ano em que chegou a Braga vinda do Brasil. Deixa-nos à vontade. O espaço não é muito grande, mas está repleto de cor, livros, cartazes, panfletos. A luta pela igualdade de género grita nas paredes.

O trabalho da UMAR faz-se nas ruas, mas não só. Tatiana Mendes está no núcleo desde o início, representando o mesmo na direção nacional. Conta que o apoio prestado a vítimas de violência doméstica e a realização de estudos estão no topo da agenda da associação. Contudo, o assunto do dia é o projeto Arthemis+.

Inspirado no nome da deusa grega, o programa dedica-se à prevenção primária da violência de género e promoção de Direitos Humanos e igualdade de género. Alícia entrou no projeto pouco depois de entrar no núcleo. É com entusiasmo que fala do trabalho que desenvolve. “O objetivo principal é prevenir a violência antes que aconteça”. “Há o intuito de trabalhar comportamentos, atitudes, crenças”, complementa a colega.

É nas escolas que o projeto toma corpo, através de sessões com estudantes, mas também com docentes e não docentes. Alícia explica que cada uma das técnicas da UMAR tem cerca de 12 turmas por ano letivo. “A gente vai de 15 em 15 dias à sala de aula e dinamiza atividades sobre algum tema que o grupo escolheu. Assim, conseguimos que a aprendizagem  seja significativa”. Desde o jardim de infância até ao ensino secundário e profissional, todas as idades são abrangidas. “Cada turma é acompanhada durante três anos, no mínimo. Procuramos fazer um trabalho continuado”.

O programa vai além de meras apresentações. A arte é chamada à discussão, procura-se também ensinar com pincéis e tinta. No final, é organizado um evento para divulgar as obras. “Esperamos sempre que este seja um momento de partilha e de construção, de conversa entre os pares e grupos. Essa troca pode ser frutífera para as crianças e jovens envolvidos”.

Arthemis+ está implementado em diferentes distritos e em vários agrupamentos, havendo sempre a preocupação de “descentralizar”. "Às vezes é a gente que faz o contacto, às vezes são as escolas”, conta Alícia. Tatiana revela que o programa é muitas vezes enquadrado na disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. “As escolas encontram aqui cabimento para o projeto, tendo em conta o seu âmbito e os diferentes temas que trabalha. A partir do Arthemis+, alguns docentes vão pedindo que trabalhemos uma ou outra questão”.

Como forma de perceberem o impacto que estão a ter, fazem avaliações qualitativas ao longo das sessões. “Isso dá-nos alguma ideia do que vamos fazendo”, explica Tatiana. Os resultados têm sido satisfatórios. “Ainda esta semana estava a submeter as avaliações e numa das perguntas sobre o que mudaria no projeto, o aluno falou sobre si”. Na resposta, lia-se: “eu mudei a minha forma de ver as pessoas LGBTQIA+, antes eu não as respeitava e hoje em dia respeito”. O rosto de Alícia ilumina-se. "As orientações e as identidades de género são questões muito solicitadas pelos jovens", acrescenta Tatiana.

Bem me gosta ou mal me gosta?

É também no âmbito deste programa que a UMAR divulga anualmente o Estudo Nacional sobre Violência no Namoro. Publicado, como é costume, no dia 14 de fevereiro, o relatório deste ano contou com 5916 jovens, com idades entre os 11 e os  25 anos. O questionário é aplicado presencialmente aos estudantes. Nenhuma das turmas abrangidas pelas sessões do Arthemis+ são incluídas neste trabalho.

Alícia, uma das 15 pessoas que fez parte da equipa de investigação, explica o objetivo. “A gente busca perceber a evidência de vitimação, ou seja, se já vivenciaram algum dos comportamentos elencados e por outro saber se as pessoas  consideram esses comportamentos como violência”.

A investigadora destaca algumas particularidades dos resultados deste ano. “Há muitos comportamentos que não são vistos como violência: controlo das redes sociais, das passes e do telemóvel”. Há uma constante normalização destas atitudes, sendo frequente ouvir frases como “a gente partilha tudo entre nós, não há segredos”. “E o direito à individualidade, à privacidade e liberdade?” O tom de voz aumenta, há indignação no rosto de Alícia. “Ainda há aquela ideia de que se estamos numa relação, devemos algo à outra pessoa”.

O estudo conclui que os números são “preocupantes”, principalmente no que diz respeito a comportamentos de violência psicológica e de controlo. Jovens que se identificam com o género feminino apresentam maiores percentagens nos indicadores de vitimação, com exceção para a violência física. Pessoas com identidades não binárias também evidenciam percentagens bastante elevadas nestes indicadores. O documento ressalta a importância de se refletir sobre “as experiências de violência vividas por grupos sociais com características identitárias não normativas”.

Alícia ajeita-se na cadeira. Os resultados são a prova de que é “necessário e pertinente” continuar o Arthemis+. “Trabalhar todas essas crenças, ideias e comportamentos antes mesmo de eles acontecerem”. Ao lado, Tatiana acena em concordância. “Este estudo reforça a importância da prevenção primária da violência em contexto escolar.  Ali nós podemos trabalhar desde cedo e quanto mais cedo melhor”.

"Há uma urgência em trabalhar estas questões", é a conclusão a que chegam. Por isso, partilham que nesta mesma sala foi pensada, há cerca de dois anos, a campanha - Bem me Gosta ou Mal me Gosta? Resulta de uma parceria entre o Arthemis+, o projeto Viva e o Núcleo de Braga.

Tatiana confessa que foi uma ideia que demorou a sair do armário. “Tínhamos de atender a todas as pessoas e, portanto, se queríamos fazer uma campanha não podíamos pensar de forma heterossexista. A intimidade não se dá só em relações heterossexuais. A nossa ideia foi criar algo com impacto”. As duas colegas sorriem. Passo a passo, procuram promover uma sociedade em que a igualdade de género e a não violência são uma realidade. Para isso, é preciso começar cedo. O fim da conversa coincide com o badalar dos sinos da igreja mais próxima. Está na hora de ir embora.

Tatiana Mendes (esquerda) e Alícia Wiedemann (direita)

Tatiana Mendes (à esquerda) e Alícia Wiedemann (à direita)

Retrato da ativista Marielle Franco, um dos produtos artísticos do projeto

Retrato da ativista Marielle Franco, um dos produtos artísticos do projeto

Relatório do Estudo Nacional sobre Violência no Namoro

Relatório do Estudo Nacional sobre Violência no Namoro

Cartaz da campanha "Bem me Gosta ou Mal me Gosta?" (retirado do Facebook da UMAR)

Cartaz da campanha "Bem me Gosta ou Mal me Gosta?" (retirado do Facebook da UMAR)

Desenho elaborado no âmbito do projeto (retirado do site do Arthemis+)

Desenho elaborado no âmbito do projeto (retirado do site do Arthemis+)

Item 1 of 4

Retrato da ativista Marielle Franco, um dos produtos artísticos do projeto

Retrato da ativista Marielle Franco, um dos produtos artísticos do projeto

Relatório do Estudo Nacional sobre Violência no Namoro

Relatório do Estudo Nacional sobre Violência no Namoro

Cartaz da campanha "Bem me Gosta ou Mal me Gosta?" (retirado do Facebook da UMAR)

Cartaz da campanha "Bem me Gosta ou Mal me Gosta?" (retirado do Facebook da UMAR)

Desenho elaborado no âmbito do projeto (retirado do site do Arthemis+)

Desenho elaborado no âmbito do projeto (retirado do site do Arthemis+)

Não se previne, educa-se

O rosto de Vânia Beliz mostra-se no pequeno quadrado de um ecrã de computador. De vez em quando, o seu gato ocupa a câmara e rouba as atenções. A distância entre Beja e Braga é encurtada pelo ZOOM. Licenciada em Psicologia Clínica, fez um Mestrado em sexologia especializado na área feminina e doutorou-se em saúde infantil. A conversa corre para aquilo a que dedicou anos de estudo e pesquisa: a sexualidade.

Sessão dinamizada numa escola (foto cedida por Vânia Beliz)

Sessão dinamizada numa escola (foto cedida por Vânia Beliz)

Trabalhar “mais cedo” a aprendizagem da sexualidade. Este foi o mote para o começo da ação no terreno. Lidar com adultos elucidou Vânia sobre a existência de “lacunas por falta de educação para a sexualidade numa idade mais precoce”. Desafiada a escrever um livro dirigido ao público mais novo, acabou a rodear-se dos “pequeninos” em visitas a escolas.

"A Viagem de Peludim", livro escrito por Vânia Beliz (foto retirada do site: Coisas de Filhos)

"A Viagem de Peludim", livro escrito por Vânia Beliz (foto retirada do site: Coisas de Filhos)

Foi uma questão de tempo até que passasse a desenvolver sessões de formação para a sexualidade, desde o pré-escolar até ao ensino secundário. Ou contratada pelos municípios, ou por convite de Associações de Pais, Vânia vai saltando pelo país.

Nas idas aos estabelecimentos de ensino, a sexóloga vai além das questões fisiológicas e biológicas - como infeções sexualmente transmissíveis, prevenção de gravidez, comportamentos de risco, - que normalmente são abordadas nas escolas, pelos enfermeiros, dentro dos projetos de saúde escolar. Vânia atua na “ótica de uma sexualidade abrangente, compreensiva, abordando vários eixos”. Para tal, faz-se acompanhar de materiais coloridos e palpáveis para mostrar, ensinar e cativar a atenção. Cria naturalidade através de “sessões muito lúdicas”, onde evita “linguagem científica”, de forma a aproximar-se mais da compreensão dos alunos.

Antes de mais, Vânia considera que os alunos se sentem “compreendidos” e “acolhidos” pelo seu método. Quando se desloca a uma escola, recolhe questões das crianças e adolescentes e, perante isto, monta uma conversa de esclarecimentos. Assim, adequa todas as sessões às necessidades de cada grupo. Por sua vez, os próprios temas também variam de acordo com as idades.

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Item 1 of 6

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Foto cedida por Vânia Beliz

Vânia não criou, portanto, “mais uma sessão para falar de riscos e coisas negativas associadas à sexualidade”. Apesar do vasto público-alvo, o maior ponto de foco continua a ser as crianças e a forma como vai “ao encontro do seu desenvolvimento e interesse". “Temos orientações demasiado breves, material muito redutor, ao contrário do guia da UNESCO, que é muito complexo". Tem oito eixos e ajuda os docentes a saber o que fazer nestas circunstâncias.

Um conjunto de países já começou estas abordagens no pré-escolar, e “o guia da UNESCO também nos diz que estes temas devem ser trabalhados a partir dos cinco anos de idade”. Pelo contrário, “em Portugal a educação para a sexualidade não é obrigatória no pré-escolar”. Vânia culpa os governos, que não têm tido “coragem para trazer os temas da sexualidade” à tona.

Mesmo com a imprecisão característica de uma vídeo chamada, os olhos brilhantes de Vânia distinguem-se na tela. A paixão com que fala sobre a matéria é visível do outro lado, mas a frustração pela inércia dos governos também. Segundo a sexóloga, existem "bandeiras políticas" a serem içadas sob esta temática, o que gera divisão no Parlamento. O conflito político dificulta a criação de um "programa nacional de educação para a sexualidade" com pés e cabeça.

"Somos um país muito pequenino", continua. "Poderíamos ter ferramentas que fossem adequadas a cada faixa etária e que fossem comparticipadas pelo Estado". O que está em falta? Investimento e perceber que este é um "tema importante da saúde", não só física, mas também psicológica.

Vânia deixa-nos um exemplo sobre a importância da escola neste processo educativo: "se queremos prevenir a homofobia, que é um crime, temos de o trabalhar nas escolas". A partir do momento em que a educação para a sexualidade se baseia em direitos humanos, "a função da escola é abordar". Deixar de o reconhecer é "permitir o obscurantismo". A chamada termina, mas o trabalho da sexóloga continua. A peregrinação que tem a fazer ainda é longa. Contudo, é com dedicação e entusiasmo que Vânia abraça o desafio de ensinar as pessoas a conhecerem a sexualidade.

Autoras

Ilda Lima

Nasci para comunicar, mas os dedos sempre se adiantaram às cordas vocais. A escrita é a menina dos meus olhos. Naturalmente também o jornalismo a ela se juntou. Preencher o papel com tudo aquilo que nunca conseguirei formular em palavras tornou-se a grande paixão da minha vida.

Joana Oliveira

Move-me a vontade de conhecer e de saber mais. Não gosto de ficar parada. Foi isto que me motivou a escolher o jornalismo. Há uma inquietação constante de descobrir mais. Um frenesim que termina nas últimas palavras escritas e que renasce em cada nova reportagem que é cozinhada. Sou fascinada por isso.

Maria Francisca Barros

O `porquê´ continua a ser a minha palavra preferida e o ponto de interrogação o término de todas as minhas frases. Os meus dedos continuam pisados pela força que faço na caneta. Continuo a viver fascinada pelo poder das palavras e de uma sociedade com tanto para dizer.  Continuo a ser a pequena Francisca, que aspira ser jornalista, viver das letras e contar histórias.